Editorial: Era do Carbono
Em alguns séculos, é plausível que o de número 21 se torne
conhecido como o primeiro da Era do Carbono. E o marco de passagem poderá
ser fixado em 10 de maio de 2013, quando a concentração de dióxido de carbono
(CO2) ultrapassou 400 partes por milhão (ppm).
Isso não ocorria há 3 milhões de anos. Jamais um ser humano --além
dos cerca de 7 bilhões vivos hoje-- havia respirado numa atmosfera com tal
quantidade do principal gás do efeito estufa.
Nenhum deles, por certo, terá notado a diferença. O CO2 não tem
cheiro nem cor e é expelido normalmente dos pulmões a cada expiração. O limite
de 400 ppm é apenas simbólico --mas não arbitrário.
Nos últimos anos, as negociações internacionais sobre a mudança do
clima, iniciadas há mais de duas décadas, se concentraram --e fracassaram-- em
torno desse valor. Sua meta era diminuir a emissão de CO2, cuja fonte mais
comum é a queima de combustíveis fósseis como derivados de petróleo, para
tentar evitar que se adicionem 2°C à temperatura média da atmosfera neste
século (no anterior, o acréscimo foi de 0,6°C).
A estimativa de que 400 ppm de CO2 resultarão em 2°C a mais
resulta de equações ainda hoje em debate. Não se exclui que o aquecimento seja
menor, ou mais lento, porque se conhece mal o papel de alguns fatores naturais,
como o comportamento dos oceanos.
Não se discute mais, contudo, se há de fato aquecimento. Em 2012,
a temperatura ficou 0,45°C acima da média de 14°C registrada no período
1961-1990. Foi o nono ano mais quente registrado desde 1850 e o 27º consecutivo
acima da média.
O gelo sobre a Groenlândia e o oceano Ártico bateu recordes de
diminuição no verão de 2012 no hemisfério Norte. Não está, porém, na elevação
do nível do mar que o degelo da primeira pode causar a maior de nossas
preocupações.
Mais temidos são os efeitos regionais sobre o clima, como invernos
mais rigorosos na Europa, secas mais devastadoras no Nordeste do Brasil e na
Austrália e furacões mais intensos no Caribe --como se viu em 2012. Cresce a
convicção de que se preparar para o estresse climático pode ser mais eficaz que
tentar deter o aquecimento.
A diminuição das emissões de CO2 só poderia ser obtida de duas
maneiras, ambas improváveis: redução drástica do crescimento populacional ou
revolução no sistema energético, com rápido abandono dos combustíveis fósseis.
Não há clima para isso. Os combustíveis fósseis ganham espaço, em
lugar de perder, com a exploração rentável do gás de xisto (EUA), do óleo de
areias betuminosas (Canadá) e do pré-sal (Brasil).
Com o mundo rico em crise e o emergente entrevendo aí a
oportunidade de acelerar o desenvolvimento, ninguém tem incentivos para
prescindir das alternativas energéticas mais baratas --e sujas.
Na Era do Carbono, a humanidade terá de exceder-se em outra especialidade
sua que não a de alterar o ambiente em escala planetária: adaptar-se a ele, a
todo custo.
Folha de São Paulo
13/05/2013 - 03h00
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