quarta-feira, 21 de janeiro de 2015



Qual a melhor idade para a maioridade penal?

         Em 12 de fevereiro de 1993, Jon Venables e Robert Thompson assassinaram, por motivos fúteis, James Bulger, dentro de uma estação de trens, em Liverpool, Inglaterra. Ambos foram presos, julgados e condenados à prisão perpétua. Seria mais um crime se os assassinos não tivessem, à época, 11 anos e sua vítima, 2 anos.

         Ao que me conste, não existe, na Inglaterra, maioridade penal aos 10 anos ou menos. Existe um equivalente nosso ao estatuto do menor, extremamente rigoroso.

         Não estou entrando no mérito na legislação penal inglesa. Penso na discussão exacerbada, pelo povo brasileiro, da maioridade penal no país.    

         Se Jon e Robert fossem brasileiros, seriam internados em uma instituição para menores e, aos 18 anos seriam libertos para tocar a vida. Se mudasse a maioridade penal para 16 anos, aconteceria a mesma coisa com eles. Se mudasse para 14 anos, idem. Se mudasse para 12, também.

         Vamos, apenas para raciocinar, que a maioridade penal no Brasil fosse 10 anos. Sendo maiores, do ponto de vista legal, os meninos apenados iriam para uma prisão de adultos. Não poderiam ficar em um estabelecimento diferenciado porque, legalmente, eles seriam maiores. Sabemos das condições de nossos presídios. Devido a sua pequena constituição, seria quase o mesmo que condená-los à morte, mediante tortura.

         Será que essa discussão sobre maioridade penal não está mal encaminhada? Será que quem defende a maioridade penal aos 16 anos, ou aos 14 anos (os defensores não gostam de números ímpares) não tem necessidade de simplificar um assunto extremamente complexo, alimentado por necessidade de vingança, não de justiça?

         Não seria mais lógico revisar nosso estatuto do menor, tornando-o mais exigente fazendo, por exemplo, que o autor de crime hediondo continuasse a cumprir pena, em presídio, depois de ter atingido 18 anos?




segunda-feira, 12 de janeiro de 2015




RELIGIÃO PROVOCA VIOLÊNCIA?

Nos últimos dez anos, 101 torcedores morreram em brigas de estádio no Brasil. O número é cinco vezes o de mortos em ataques de terroristas muçulmanos na França e o dobro das vítimas da Inglaterra no mesmo período.

Podemos então dizer que esporte mata? Que o futebol provoca violência? Pois é exatamente o que fazemos quando culpamos a religião pelo terrorismo.

A crueldade do ataque aos jornalistas do Charlie Hebdo faz muita gente ligar os pontos e afirmar que religião causa violência. Gente graúda pensa assim – como Richard Dawkins, na minha opinião um dos gênios vivos da ciência. Também parece haver bons argumentos para essa ideia. As cruzadas, as carnificinas entre protestantes e católicos nos séculos 16 e 17, os conflitos entre hindus e muçulmanos na Índia: banhos de sangue em nome da fé são frequentes na história.

Mas isso é um mito. Religião não provoca violência, ou melhor: provoca tanta violência quanto qualquer identidade de grupo. O homem mata em nome da fé, mas também em nome de ideologias políticas, da nação, de etnias, da escolha sexual, do estilo de roupas e músicas (como as gangues de Nova York dos anos 80) ou em nome de times de futebol. O problema não é a religião, mas a tendência humana à hostilidade entre grupos.

Para entender esse padrão é preciso ir longe – até o momento em que violência entrou para o repertório de comportamentos humanos, há algumas centenas de milhares de anos.

Nas savanas da África, onde o homem passou 90% de sua história evolutiva, ficar sozinho não era uma boa ideia. Significava estar vulnerável a animais ferozes e a ataques de tribos vizinhas. A solidão também resultava em fome, pois a caça de grandes animais da megafauna (o big game) exigia ação coletiva e coordenada.

Para sobreviver e ter filhos, era preciso pertencer a um grupo. Fechar um “pacto ou conspiração baseada em interesses mútuos de longo prazo”, como diz o próprio Dawkins em O Gene Egoísta. Mas pertencer a um grupo não bastava. Os genes tinham mais chances de se perpetuar se o indivíduo participasse de uma coalização vencedora. Grupos mais harmônicos e cooperativos, que armavam emboscadas com maestria, construíam boas ferramentas e abatiam o inimigo sem piedade, superavam grupos humanos desunidos.

A evolução favoreceu, assim, a tendência a dois comportamentos opostos. Entre os membros do grupo, ganhou o páreo o indivíduo capaz de sentir emoções que possibilitavam a cooperação. É o caso da compaixão, a satisfação em fazer amigos, a noção de culpa (sentimento que nos empurra para reparação e conciliação com o grupo), a vontade de castigar quem não coopera, a obsessão humana com a reputação, o medo de ficar sozinho. Ao mesmo tempo, emergiu a tendência à hostilidade e à violência contra grupos rivais. É o que os biólogos chamam de “altruísmo paroquial”.

Basta uma olhadela na história mundial para perceber que boa parte dela se resume a hordas, gangues, tropas, tribos, times, bandos, exércitos – enfim, coalizões de homens jovens cooperando entre si – lutando contra outras coalizões de homens jovens. A religião, nessa história, é mais um pretexto para justificar uma antiga tendência humana ao antagonismo entre grupos.

Não nego que algumas crenças incitem os fiéis à violência e sejam mais problemáticas que outras. Mas achar que guerras e atentados diminuiriam se as religiões acabassem é ser otimista demais com o homem. Como mostrou o século 20, não é preciso religião para haver massacres e genocídios.







A QUEM INTERESSA CRIMINALIZAR A RELIGIÃO MUÇULMANA


A população do mundo ocidental está com medo. Mais uma vez, o terror mostra sua face. Alguns dizem que estes atos demonstram a falta de Deus.

Calma com o andor. Os crimes foram cometidos em nome de Deus. Podemos afirmar que estamos com excesso de Deus.

Na verdade, embora a imprensa internacional nos bombardeie com a ideia de que as motivações terroristas são ideológicas, provocadas por um braço radical do Islamismo, isso não é verdade. Um alto representante religioso disse que os atos terroristas fazem mais mal para a religião islâmica do uma pretensa blasfêmia a Maomé. Certamente, a população de profissão islâmica foi a mais prejudicada nesse episódio, assim como o segmento mais beneficiado foi a extrema direita, xenófoba e racista, que deseja varrer a população emergente do terceiro e quarto mundo que invade a Europa.

Algum tempo, li um artigo feito em cima de pesquisa sobre motivações de homens e mulheres bomba. De maneira geral, os mártires tem uma visão muito superficial da religião muçulmana. O que os atrai para o sacrifício é o reconhecimento de seu povo e, principalmente, a proteção financeira de sua família. Não podemos esquecer de que essas populações vivem em situações de miséria inimagináveis para nós. Essa história de morrer para possuir setenta virgens no paraíso é balela.

O que está acontecendo é que o mundo está todo conectado. Todos começam a ter ideia de que pode existir mundo melhor, mais justo, do que aqueles que vivem, muitas vezes de injustiças sociais degradantes, onde a vida não vale quase nada. Esse mundo melhor ficou mais perto e mais factível. Esse mundo, entretanto, é perigoso para aqueles que sempre viveram da exploração de seus semelhantes, daqueles estão acostumados a manter o poder a custa de iniquidades e crueldades.

Para eles, basta colocar a responsabilidade dos males do mundo nos povos desenvolvidos. Aí entra a religião muçulmana. Ela é uma bandeira para seus desígnios. É utilizada por ser intolerante com outras religiões, como são intolerantes as cristãs e a sionista, todas descendentes dos ensinamentos de Moisés.

Mas para um povo que não conhece regime democrático, que não conheceu a revolução industrial, que ainda vive a idade média, com altos níveis de analfabetismo, isso é suficiente.

É a velha luta de classes, identificada por Marx, agora em nível planetário. Não é luta ideológica, não é luta religiosa, embora esses fatores estejam presentes.

Os povos ocidentais, desenvolvidos, certamente, com seu desprezo aos povos mais atrasados, tem papel preponderante na manutenção da miséria. Se os Estados Unidos tivessem utilizado uma porção ínfima dos dólares que queimaram arrasando populações como a afegã, em educação e respeito aos costumes daqueles povos, certamente, hoje, não teríamos terrorismo. O mesmo se pode dizer dos europeus, com seu trágico  colonialismo.

Mas o terrorismo também interessa aos líderes dos povos desenvolvidos. Sim, porque o medo, incutido na população, facilita seu domínio, domesticando-a.