sábado, 31 de março de 2012



Momento sexi do blogue. 
Apresentamos a coelhinha da Playboy


amizade


desculpem-me 

os humanos, mas Deus caprichou 

mesmo,

quando desenhou os gatos





31 DE MARÇO – LAMENTÁVEL EQUÍVOCO, TRÁGICO EQUÍVOCO.

1964 – Em março, matriculei-me na Faculdade de Arquitetura da UFRGS, sonho acalentado desde criança. Se tudo corresse bem, seria arquiteto. O destino conspirava a meu favor, pensava eu. A faculdade era uma das melhores do país, com professores arquitetos consagrados, muitos com extensa bibliografia publicada. O país ainda comemorava o sucesso internacional de Oscar Niemayer e Lúcio Costa com sua iluminada Brasília. Arquitetura era uma profissão respeitada, sonho de muito jovem emergente. Entretanto, o vestibular era difícil, limitado a poucos.

Em abril, começou a degola do corpo docente. Uns foram aposentados compulsoriamente, outros, simplesmente mandados embora. Seu pecado: pensar de maneira independente. Assim, saíram Demétrio e Enilda Ribeiro, Edgar Albuquerque Graeff, Edvaldo Ruy Pereira Paiva, Luiz Fernando Corona e Nelson Souza. Ficaram apenas os mansos.

A degola atingiu também os alunos que faziam política estudantil. A partir desse momento, o Centro Acadêmico da Faculdade de Arquitetura virou apenas DAFA e seus dirigentes passaram a ser nomeados.

A faculdade de arquitetura, com a saída do que tinha de melhor, seus cérebros, ficou paralisada. Havia um sério problema para serem nomeados novos professores (naquele tempo não havia concurso público, como hoje). Os arquitetos bem sucedidos tinham sido formados por agora colegas que tinham sido demitidos e recusaram-se a aceitar cargos que haviam sido subtraídos de seus mestres.

Restou, então, à administração obediente à ditadura militar, catar qualquer um que se dispusesse a substituir os professores afastados. Assim, foi formado novo quadro, de qualquer jeito. Conta-se que uma arquiteta, que tinha virado “do lar”, foi convidada, por telefone, quando lavava a roupa da família. Imediatamente, aceitou.

1968 – Com a decretação do AI-5, a ditadura dentro da ditadura, os ambientes onde eu transitava, a Faculdade de Arquitetura e o Banco do Brasil, meu empregador, tornaram-se sufocantes. Todos os direitos individuais foram subtraídos, os locais eram focos de delação. Todo tipo de cultura era censurado, por motivos os mais triviais.

                Era necessário fazer alguma coisa. Foi então que meu amigo íntimo, colega de banco e de faculdade, Felix Silveira da Rosa Neto, me convidou para participar do VAR PALMARES, grupo armado que fazia oposição ao regime ditatorial, com a liderança de Lamarca.

                Aceitei e comecei uma vida paralela. Meu amigo Felix, certamente como viu que eu era uma pessoa despreparada para ações armadas, por falta de experiência e mesmo por temperamento, começou dando-me atividades por assim dizer, burocráticas. Passava mensagens escritas ou orais de um membro para outro (havia o medo de os telefones estarem grampeados), vigiava policiais enquanto o grupo fazia pichações, etc.

                As reuniões eram realizadas em meu apartamento, na Fernando Machado. Nessas ocasiões, eu tinha que sair, por questão de segurança.

                Ficava sabendo, em primeira mão, das atividades do “meu” grupo. Assim, fiquei sabendo do assalto ao Banco do Brasil, em Viamão, com a participação de um membro que, mais tarde, viraria simples assaltante de banco e, da preparação e tentativa frustrada do cônsul americano, do qual participou, também, um atual ministro de Dilma.

                O desfecho da ação de tentativa de sequestro todo mundo já sabe. As forças de segurança consideram ponto de honra localizar e prender os sequestradores. Felix foi preso quando, prestes a cair na clandestinidade, foi se despedir da mãe, no apartamento que morava, na Rua Ramiro Barcelos. Um exemplo de amor filial.

                Felix foi torturado barbaramente para denunciar seus companheiros. Passei, naquela época, talvez, os piores momentos de minha vida. Acabou indicando alguns que já tinham caído na clandestinidade. Fui poupado, talvez por caridade, talvez pela pouca importância de meu cargo.

                Felix foi condenado a treze anos de prisão. Desses treze, cumpriu oito anos de regime fechado. Visitei-o algumas vezes na Penitenciária Agrícola de Charqueadas, depois de condenado, quando a pressão diminuiu. Parei de visitá-lo quando minha ex-mulher, que também tinha estado presa no DOPS, me avisou que andava sendo seguida ostensivamente, provavelmente por um policial.

                Após essa experiência, casado e com três filhos pequenos, atirei-me de ponta cabeça no mercado, para sobreviver.

                O mundo mudou, não existe mais ditadura militar, não existe mais União Soviética, não existe mais comunismo, com exceção da moribunda ditadura cubana e dos esfaimados coreanos do norte.

                Ficou, para a história, a vergonhosa ocorrência do massacre, perpetuado pelo exército, contra setenta e quatro jovens, despreparados e mal armados, a maioria morta depois de ser presa, na chamada “guerrilha do Araguaia” (ver “A ditadura escancarada”, de Elio Gaspary).

                Reencontrei Felix há dois anos, em Passo Fundo. Estava em estado deplorável. Não me reconheceu, ou fez que não me reconheceu. Falou algumas coisas sem nexo e me deixou no meio do salão do clube em que estávamos. Apenas passou um recado cifrado. Disse: -Só dói quando rio. Ele sabia que eu entenderia a mensagem. Este é o texto de uma charge do Ziraldo, que saiu no Pasquim. A uma pessoa, que pergunta como ela está, a outra, com uma espada enfiada no corpo, responde: -Só dói quando rio.


quarta-feira, 28 de março de 2012



ARQUITETURA DIGITAL

Depois de ler  este artigo, cheguei à conclusão de que tenho que voltar para a faculdade. Pensando bem, tenho que voltar para o MOBRAL.
Caros colegas, leiam o material do link seguinte e me digam se não tenho razão:

terça-feira, 27 de março de 2012

MATADOURO 5
,
"Quando do surgimento do nazismo, muitas pessoas o defenderam. Outras o condenaram. Todas estão mortas. Eu não defendi nem condenei e estou vivo".

Essa cínica frase de Pitigrilli é a essência do romance "Matadouro 5", de Kurt Vonegut Jr. A obra trata da vida de um cidadão americano, cuja característica primordial é ser medíocre e alienado. Seu comportamento permite que ele vá sobrevivendo à todas as tragédias por que passa.

Durante a segunda guerra mundial está para ser morto por seus companheiros de farda. É, então, aprisionado pelo exército alemão. Um professor evita que seja assassinado por um outro prisioneiro que o acusa de matar um companheiro. Transferido para Dresden, escapa de um bombardeio aliado, em que morrem 135.000 pessoas.

 Após a guerra, faz um curso de optometrista e casa com a filha encalhada do dono da instituição onde estudou. É o único sobrevivente de um desastre aéreo. Nesta ocasião sua esposa morre em desastre automobilístico quando tenta chegar ao hospital onde ele estava internado. Seu mais próximo amigo é um cachorro. Acaba sendo morto pela única pessoa que  o vê como realmente é.

Para se manter íntegro, criou um outro mundo (ou foi abduzido por ele), em que se refugia com uma namorada, também fruto da mesma fantasia (ou abdução), Essa namorada é a mesma da fotografia que seu filho utiliza para se masturbar no banheiro, O refúgio (ou prisão) é, simultaneamente, uma gaiola em um lugar, semelhante a um zoológico, onde não há presente, passado, futuro, nem bem nem mal. As coisas apenas são.

Esse romance foi filmado em 1972. Eu o revi há pouco. Antes,o tinha visto no Cine Vogue, na Independência (lembram?). Não o esqueci. Agora, localizei-o no ótimo blog luzitano "My One Thousand Movies". Depois de baixá-lo, o gravei e assisti.

Reproduzo aqui o comentário de Chico, proprietário do blog:

As diferentes etapas da vida de Billy Pilgrim (Michael Sacks) entrecruzam-se mas sem ligação ou continuidade. Billy é um sobrevivente do bombardeamento dos Aliados sobre a cidade alemã de Dresden durante a II Guerra Mundial. Este passado convive sem problemas com o seu presente, o de um americano caucasiano de classe média que vive a sua rotina. Porém, Billy tem outra inquietante faceta que também procura uma lugar na sua existência: tendo sido sequestrado pelos habitantes do planeta Trafalmadero, ele é exibido no Jardim Zoológico local como um ser extra-planetário.
Adaptação para o cinema do famoso romance de Kurt Vonnegut Jr. que mistura ficção, comédia, drama e aventura para contar a história do obsessivo Billie Pilgrim. Matadouro 5, de George Roy Hill, foi vencedor do Prémio Especial do Júri no Festival Internacional de Cinema de Cannes.
Uma obra perdida no tempo.



Recomendo esse filme.










San Gimignano

Esta cidadezinha, que pertence à Siena, região da Toscana, é uma pérola de arquitetura e urbanismo medieval. Circulando por ela, tirando os automóveis e as vestes das pessoas, sentimo-nos como tivéssemos feito uma viagem ao passado e aterrissado na idade média. 
Visitá-la vale uma ida à Itália




sábado, 24 de março de 2012




KEITH RICHARDS

Li “Vida”, autobiografia de Keith Richards. Aconselho sua leitura para pessoas inconformadas com a vida que vivemos, isto é, todas! Ele é um arraso!

Confesso que sempre virei um pouco o nariz para os Rolling Stones. Achava o som deles meio sujo, tipo cada um toca para si e Mick Jaeger se rebola para sua vaidade. Reconhecia que algumas músicas deles, como Sactisfation e Brown Sugar são excelentes. Mas era só. Para mim, supra-sumo eram os Beatles, com seu som afinadinho, estudado e muito inventivo.

Meu primeiro engano. O som “sujo” dos Rolling Stone é e sempre foi uma jogada de marketing. Imaginem uns rapazes britânicos que querem lançar-se no mercado musical logo depois do estrondoso sucesso dos Beatles. Vão fazer um som arrumadinho, igual ao deles? Vão sempre ser covers dos Beatles. Serão sempre os segundos. Isso era tudo que Mick e Keith não queriam ser.

Meu segundo (e último) engano. Sempre achei que Keith Richards fosse um porra louca. Ele é um PORRA LOUCA GENIAL. O cara é sensível, humilde, reflexivo de seus atos. Keith é um filósofo.

Vamos aos fatos: Em 1973, revista New Musical Express colocou Keith Richards, principal guitarrista e alma musical dos Rolling Stones no topo de sua lista anual de “estrelas do rock com maior probabilidade de morrer” naquele ano. Mesmo para um roqueiro, Richards consumia quantidades hercúleas de heroína, cocaína, mescalina, LSD, peiote, Mandrax, Tuinal, maconha, Bourbon e demais refrescos. Todos os colaboradores achavam que ele estava com os dias contados. Àquela altura, a lista de baixas no rock era longa e agourenta: Jimi Hendrix, Jim Morrison e Janis Joplin eram apenas os nomes mais  célebres a encabeçar o obituário. Em 1969, havia morrido Brian Jones, que foi achado morto na piscina de sua casa, poucas semanas após ser demitido dos Stones. Em vez de preservar sua mortalidade, Richards preferia exibi-la de forma acintosa. Registrou para a posteridade seu quase constante torpor, dando livre acesso a Robert Frank, Annie Leibovitz e outros fotógrafos, que o captaram nos camarins e quartos de hotel, seminu e completamente doidão. Ao ver aquelas imagens de Richards, largado, chapado e leso, imaginava-se que era uma questão de dias para que a imprensa anunciasse que ele havia morrido sufocado em seu próprio vômito.

Na realidade, Richards foi em frente, tropeçando pelos concertos em uma névoa narcótica, dormindo durante os ensaios, sempre à beira do olvido e, mesmo assim, produzindo, junto com Jaeger parte da música pop mais memorável da época. Entre 1968 e 1972, os Stones gravaram Beggars Banquete, Let It Bleed, Sticky Fingers e Exile on Main Street, a essência do repertório deles. Continuaram a tocar essas músicas por tanto tempo quanto Sinatra cantou Love and Marriage. A peculiaridade dos Stones se devia menos aos vocais de Jaeger do que a capacidade de Richards de absorver o estilo blues das guitarras de Chuck Berry e Jimmy Red, criando algo novo. Havia músicos muito mais técnicos, solistas muito melhores, mas a noção de ritmo e de riff dele, seu bom gosto, seus acordes sustentados e espaços abertos marcaram o som dos Stones. E, ao longo disso, a Indesejada  não conseguiu entrar no camarim. Depois de deixar Richards no topo da lista de seu observatório da morte por 10 anos, o New Musical Express finalmente jogou a toalha e admitiu que ele fosse imortal (Revista Piauí, janeiro 2011).

Keith Richards foi um garoto pobre, criado nos subúrbios de Londres, logo após a Segunda Guerra Mundial (ele nasceu em 18 de dezembro de 1943, em plena guerra). Seu avô materno era músico e influenciou muito sua formação. Ao conseguir vaga em um conservatório, aproveitou ao máximo tudo que aprendeu de música, assim como de artes plásticas.

Nessa época, conheceu Mick Jaeger. Os dois eram apaixonados por Blues e Rhythm and Blues. Ao contrário de John Lennon, ele não era interessado por rock’n’roll. Sua paixão era por músicos negros mais antigos. Richards fazia de tudo para conseguir discos da Chess Records, gravadora de seus ídolos e, pacientemente, repetia todos os acordes e riffs. Ele conta que os long plays foram sua escola.

Mais tarde, ao tentar reproduzir algumas músicas, viu que a afinação que usava não era suficiente para reproduzir todos os efeitos sonoros. Ao trabalhar com Ry Cooder descobriu a afinação que é a essência do blues. É um acorde aberto, com as cordas soltas em ré, sol, ré, sol, si, ré. Ou seja, as cordas soltas soam como o acorde em sol maior. Esse acorde facilita o uso de cordas dobradas, a alma dos riffs (que Chuck Berry desenvolveu com maestria). Mais tarde, eliminou a sexta corda, que era  só uma  repetição e depois encomendava guitarras com apenas 5 cordas. Essa afinação também foi usada por Robert Johnson, figura mítica do  blues, Son House e Charley Patton. Don Everly também a usou em By, By Love. Usando uma  Fender Telecaster assim afinada, fez os riffs de Tumbling Dice, Brown Sugar, Honky Tonk Women, All Down the Line, Can’t You Hear Me Knocking, entre outros.

Keith Richards explica: Se você está tocando o acorde de maneira certa, consegue  ouvir outro acorde soando por trás do qual você está tocando, mas  que não existe. Isso desafia a  lógica. O acorde está dizendo: vem! A guitarra torna-se uma enguia elétrica.

Keith Richards não é apenas merecedor de estar em todas as listas dos melhores guitarristas de todos os tempos. Ele é um guerreiro, sempre acreditou em seu talento, desenvolveu novas técnicas em vários instrumentos (também toca piano e baixo), é um excelente compositor. Drogou-se bastante, é verdade, mas sempre com drogas puras, como frisa, foi e é um bom vivant. Segundo ele, sempre comeu as melhores putas e bebeu as melhores bebidas. Agora é um pacato pai de família. Como Mick Jaeger, com o tempo, seu comportamento selvagem no palco virou uma “persona”, uma projeção do que já foi.
Longa vida para Keith Richards!





SOBRE A FINITUDE DA VIDA E TUDO QUE DAÍ VEM


Fomos educados para acreditar que a vida tem um sentido. Esse é um princípio religioso que norteia todos os credos que existem. Desde o início da história da humanidade, os homens procuram uma razão para sua existência.  
O nascimento de Cristo, que é a representação da maternidade, gesto importante na trajetória humana, é estrutural para a religião cristã. Essa encenação aparece também em outras religiões orientais, algumas bem mais antigas do que a cristã.
A morte de Cristo, em suplício, também tem representações semelhantes.
Esses dois acontecimentos, nascimento e morte, têm ocupado os seres humanos desde o início de sua história. O mistério do nascimento, assim como a dimensão brutal do encerramento da existência, com o fim da história individual das pessoas, tem assustado os homens (e mulheres) desde que eles tomaram consciência de que existem. É a velha indagação, de onde viemos e para onde vamos.
Essas preocupações procuram colocar a espécie humana dentro de um critério lógico, racional. Afinal, somos ou não somos racionais? Dentro desses critérios, para todo o efeito, tem de haver uma causa.
Inicialmente, essas indagações foram respondidas com a criação deuses representados pelos fenômenos naturais. Afinal, eram eles que provocavam catástrofes, com sofrimento e mortes. Mais tarde, por uma questão de síntese simplificadora, foi criado o monoteísmo, que é a base das religiões atuais. Os sistemas filosóficos, mesmo os não embasados em religião, também tem sua estrutura na questão de causa e efeito. Assim, a civilização, principalmente a ocidental, criou duas formas de pensamento: a procura da verdade revelada (religiosa) e a da verdade prospectada (filosófica). Os dois pensamentos, entretanto, continuam baseando-se na velha lei de causa e efeito.
Ultimamente, talvez em função de novas relações propiciadas por tecnologias de informação, tem aparecido alguns pensadores, que poderíamos chamar de neo ateus, ou neo agnósticos, por falta de outra denominação, que perguntam se essas questões religiosas e filosóficas não estarão limitadas ao cérebro das pessoas.
E se os fatos concretos não obedecerem às leis de causa e efeito? Se todo o funcionamento da natureza obedecer a outros princípios ou mesmo não obedecer a princípio nenhum?
Essa é uma idéia atraente. Por consequência dela, todo um pensamento preconceituoso, que já dura milhares de anos, poderia ser jogado para o lixo da história. Os seres humanos, despreocupados com as questões do início e do fim, poderiam ocupar-se com coisas mais interessantes, como viver plenamente essa existência, que, afinal, todos sabemos que está aí.





PORQUE GOSTO DE SER RETRÔ


Carlos Drummond de Andrade disse que após os 70 anos, pode-se dar uma banana para o mundo. Ótimo. Como me faltam apenas um ano e meio para esta data, já estou praticando, com prazer, o gesto.
Cansei de tentar ser moderninho, tentando acompanhar a última moda na música, no cinema, nas artes plásticas. Cansei porque essa é uma atividade extremamente cansativa. Quando estamos dominando algum novo movimento, já aparece outro. E tudo recomeça. Os modismos se sucedem com cada vez maior rapidez.
Federico Fellini dizia que um dos maiores problemas da atualidade é o da hiper comunicação. Falou isso nos anos 70. Imaginem se vivesse hoje!
Refugio-me em alguns lugares do passado. Vivo bem lá, as coisas são tranquilas, sem sobressaltos.
Vejo filmes cujas cenas são lentas, pausadas, imagens como um quadro de Matisse. Nada de cinema fliperama. Assisti a um filme de Akira Kurosawa (Trono Manchado de Sangue) cuja lentidão é um exercício para nossa paciência. Curto filmes de Alfred Joseph Hitchcock (meu tocaio, descobri agora), cujo suspense é organizado e cerebral. A cor preferida é P&B.
A propósito, no trânsito urbano, ando sempre pela direita, o lado de quem não quer ser incomodado. Geralmente, dessa maneira, chego antes, embora isso não tenha a menor importância.
Alimentação é um ritual de provar, com calma, o sabor dos alimentos que, na minha idade, podem e devem ser ingeridos em quantidades cada vez menores É o slow food, dentro da slow life.

Ouvir música é um capítulo à parte. Nada de Adele, ela vai ser substituída logo, como foi a coitadinha da Amy Winehouse. Ouço jazz, que é eterno. Experimentem o prazer de ouvir, por exemplo, Take the A Train, de Billy Strayhorn, com a Nikki Yanofsky. Ou assistir, em DVD, “A Concert of SACRED MUSIC At Grace Cathedral”, com o imortal Duke Ellington. Deliciem-se ouvindo o CD de Susannah McCorkle todo com músicas de Cole Porter. Ou a voz poderosa de Dee Dee Bridgewater, cantando blues de raiz. Ou a maravilhosa inglesa Jane Monheit cantando música brasileira de Tom, Marcos e Paulo Valle e Ivan Lins, com encantador sotaque lusitano. Ou ainda, Ray Charles, no Olimpia de Paris, em um de suas últimas apresentações. Ou Dina Washington, ou Sarah Vaughn, ou Ella Fitzgerald, ou Jamie Cullum, ou Melody Gardot...

Escuto, sempre, rock’n’roll, com Brenda Lee, Jerry Lee Lewis, Little Richard e Chuck Berry, ou mesmo, John Lennon.

E, por fim, nada, mas nada mesmo, de televisão e jornal. Alienação é fundamental.

 

 




KING CURTIS

Curtis Ousley (7 de fevereiro de 1934 – 13 de agosto de 1971) conhecido artisticamente como King Curtis, foi um virtuoso saxofonista americano que interpretava, sempre com muito talento, diversos tipos de música, como rhythm and blues, rock’n’roll, soul, funk e soul jazz. Também foi band leader e produtor musical.

Tocava indistintamente sax tenor, contralto e soprano. Ficou conhecido por seus “riffs” e solos. Sua interpretação de “Yakety Yak”, sucesso da banda The Coasters, inspirou outros músicos, como Boots Randolph e foi base para sua composição “Stew Menphis Soul”.

CARREIRA

King Curtis começou a tocar saxofone com a idade de 12 anos, em Fort Worth (Texas). Interessou-se por jazz, rhythm and blues e música popular. Excelente aluno de música, recusou bolsas de estudo para participar da banda de Lionel Hampton. Durante esse tempo, ele compôs e arranjou músicas e aprendeu a tocar guitarra. Em 1952, Curtis mudou-se para Nova York e tornou-se músico de estúdio, trabalhando em gravadoras como Prestige, Enjoy, Capitol e Atco. Nesse periodo, gravou com Nat Adderley, Wynton Kelly, Buddy Holly e Andy Williams.

Estilisticamente, Curtis teve a inspiração de Lester Young e Gene Ammons. Conhecido por seu estilo sincopado e percutido, ele foi, ao mesmo tempo, versátil e poderoso. Reuniu, em gravações, músicos como Richard Tee, Dupree Cornell, Jemmont Jerry e Bernard Purdie.

King Curtis gostava muito de jazz, mas decidiu ser músico de rock. Da década de 50 até meados de 60, trabalhou como músico de estúdio em seus próprios discos e participando de bandas, como The Coasters. Buddly Holly contratou-o para gravar “Reminiscing”. Nessa época, ele gravou “Soul Twist” e “Soul Serenade”.


Em 1965, foi contratado para a Atlantic Records, gravando seus singles de maior sucesso, como Memphis Soul Stew e “Ode to Billie Joe”. Ele tocou com a banda King Pins, que acompanhava Aretha Franklin. A banda King Pins abriu o show dos Beatles, no Shea Stadium, no bairro de Queens, em Nova York em 1965.

Nesse período, também gravou para Groove Records, produzindo discos, muitas vezes trabalhando com Jerry Wexler.

Em 1970, ele gravou, com Aretha Franklin e os King Pins, “Aretha Live at Fillmore West” e “Live at Fillmore West” com a música “Memphis Sttew Alma” e versões de Isaac Hayes, Led Zeppelin e Steve Wonder. Em sua banda tocaram Billie Preston, ao órgão Hammond, Jerry Jemmot ao baixo, Cornell Dupree na guitarra, Pancho Morales na percussão, Bernard Purdie “Pretty” na bateria e mais os Memphis Horns. A música “Whiter Shade of Pale”, da banda Procol Harum, deste disco, foi usada como trilha sonora do filme Cult britânico “Withenail and I”

Em julho de 1971, Curtis gravou solos de saxofone em “Is so hard” e “I don’t wanna be a soldier, mama, I don’t wanna die, no disco “Imagine”, de John Lennon. Junto com os Rimshots, também gravou “Soul Train”, música tema do  aclamado programa de televisão do mesmo nome.

MORTE

Por volta da meia noite do dia 13 de agosto de 1971, Curtis estava carregando um aparelho de ar condicionado para seu apartamento, quando deparou com dois drogados na frente do prédio. Solicitou que eles se afastassem. Isso gerou uma discussão e um dos indivíduos, Juan Montañes, esfaqueou Curtis no peito. Curtis foi hospitalizado, mas não resistiu aos ferimentos. Seu assassino foi preso horas depois.

No dia do funeral de King Curtis, a Atlantic Records  fechou seus escritórios. O pastor Jesse Jackson fez a oração de despedida, com um coral entoando a música “Soul  Serenade”. Aretha Franklin cantou “Never Grow Old” e Stevie Wonder cantou “Abraham, Martin,  John, King Curtis e agora?”

Curtis foi enterrado em Farmingdale, Nova York, o mesmo cemitério que onde estão os grandes do jazz, Count Basie e John Coltrane.

LÁUREA

Curtis foi agraciado com o “Rock and Roll Hall of Fame” em 6 de março de 2000.

 

Fonte: Wikipédia (tradução livre)

 



MEU ENCONTRO COM KING CURTIS

 Estava de casa nova. Na verdade, meu primeiro imóvel, comprado com a venda de uma carta de consórcio de um fusca, mais o auxílio generoso da tia Gioconda. Era um apartamento de um dormitório, em um pequeno edifício na rua Fernando Machado, no Alto da Bronze. Ficava em um terceiro andar e meio, de fundos para um abacateiro.


De fundos, sim, mas da pequena área de serviço, tinha-se uma vista deslumbrante para o Guaíba. Instalados os acessórios essenciais, como cama, fogão, geladeira, era hora de montar o som. Claro que não era qualquer som. O Zezinho, estudante de arquitetura não podia ter um som mediano. Tinha que ser “o som”.


As peças sonoras, naquela época, eram compradas separadamente, com todo o carinho e dedicação que o aparelho merecia. Era um som sob medida. Primeiro, o toca-discos. Sua marca, Philips. Totalmente manual, como tinha que ser um toca disco de classe. O braço, muito leve, com contrapeso para calibrar a pressão da agulha com o acetado. O contato com o disco era pura carícia. Esse Philips tinha um requinte só dele: todos os comandos eram acionados de três luzinhas no chassi. Vejam só: era só tocar as luzinhas, ele andava, parava ou trocava de velocidade (não podemos esquecer que, além dos long plays, havia os populares singles, em 45 rotações). O Philips ainda tinha uma sofisticação extra. No fim do disco, o prato parava de girar, apagava-se a luzinha do play, acendia a do stop. Supimpa! O amplificador era um Gradiente. Só poderia ser um Gradiente. Certo, havia outros importados, como Grundig, Panasonic e Marantz. Seus preços, entretanto, eram proibitivos (não havia, ainda, globalização). Então tinha de ser Gradiente, um ótimo aparelho. O aparelho só fazia uma coisa: amplificar. Mas fazia isto muito bem, com seus 32 watts de potência. As caixas de som permitiam que fossem exibidos dotes artesanais.


 Com o assessoramento técnico acústico do alemão Günter, foram carregados, com muito esforço, dois tubos de concreto, desses de esgoto, para o apartamento. Não disse que o edifício não tinha elevador, não é? Esses tubos, com um metro de altura e a mesma medida de diâmetro, foram colocados na vertical, cada um com um alto falante de 12” voltado para o piso. Havia, claro, tuiteres montados nas paredes, apoiados em latinhas de cerveja, Mas o som poderoso, mesmo, vinha dos tubos.


Para abrilhantar o resultado, um long play de King Curtis. Seu nome era “Sweet Soul”. Um disco encantador, apaixonante. As músicas, todas em ritmo de soul, com uma grande massa de cordas e madeiras e o sax alto de Curtis rasgando ao meio aquele veludo sonoro. Não dava para parar de ouvir. Quando o Philips encerrava a audição, o braço era levado para o início, e assim por diante. O volume tinha que ser muito alto, para que se pudesse ouvir aquela música, majestosa, reverberando por todo o ambiente.


Algum tempo mais tarde, acabei travando conhecimento com um casal jovem, que era meu vizinho, dois andares abaixo. Querendo exibir a maravilha sonora que possuía, convidei-os para conhecer meu apartamento. Feitas as apresentações iniciais, não resisti e taquei King Curtis no toca discos. O casal se entreolhou, fez um sorriso amarelo e o homem disse: - Esse é o que sempre ouvimos lá de casa. Feliz ou infelizmente, os meus tubos sonoros eram lacrados. Se não, eu teria, literalmente, entrado pelo cano, naquele momento.


É, King Curtis ficou naquele escaninho de minha memória, assim como minha ingenuidade.

PUNHETAS (ODE À MASTURBAÇÃO)


 Em nossa sociedade permissiva parece que tudo já foi dessacralizado, mas ainda resta um tabu: a masturbação. Pensem bem. A masturbação é um hábito (ou vício solitário, como alguns preferem) muito disseminado. 


Se perguntarem a três homens se masturbam-se habitualmente, dois dirão que sim. O terceiro é um mentiroso. Não sei como é essa estatística com mulheres. Desconfio que não seja diferente. A popularização do uso de vibradores, que vem com propaganda safada, informando que o orgasmo melhora o cabelo, deixa a pele mais sedosa, facilita o sono, etc., deve seduzi-las, embora a natureza não tenha sido pródiga com elas como foi com os homens. 


Eles foram instrumentalizados com um sistema “the flash”. O ato da masturbação, excluindo-se criativas (e mortais) soluções, como a de David Carradine, é muito simples. Para os homens, sempre existe a possibilidade de ser usada uma ou outra mão. Pelo folclore, parece que a esquerda é mais sensual. O importante, no entanto, não é o ato em si, mas a fantasia que é gerada para que a masturbação tenha sucesso. 


Sim, ainda não inventaram um jeito de se chegar ao orgasmo sem uma bem estruturada fantasia. Sobre isso que quero falar. As fantasias costumam ser uma simplificação de realidades passadas, adaptadas para a ocasião e para os desejos mais secretos do masturbador. Os mais preguiçosos podem apelar para a pornografia, mas esta não tem o encanto proporcionado pela criatividade de uma boa fantasia. Acredito que existam fantasiadores geniais, Cervantes da punheta, que fazem da bronha uma obra de arte. 


Na fantasia, tudo é possível. O sexo genital, anal, oral são sempre elaborados à perfeição, com o (a) parceiro (a) disposto (a) a contribuir de forma perfeita para o bom resultado do trabalho. Na fantasia, não existem queixas, negativas e outros impedimentos que possam tirar o brilho do ato. O sexo anal, que na vida real é anti higiênico, difícil e, quase sempre, odiado pelas mulheres, na fantasia ele é perfeito e prazeroso para ambos. O sexo oral é praticado com absoluta devoção pelo parceiro (a), atitude nem sempre suscetível de acontecer na vida real. 


Existem indivíduos que aproveitam para extravasar outros sentimentos, vamos dizer assim, pouco nobres. Assim, durante a masturbação, podem esganar o parceiro (a), sem nenhuma culpa. Na fantasia, ninguém escapa. Pode ser aquela vizinha gostosa, a prima, o primo, o chefe, a atriz ou ator de cinema ou novela. Todos colaboram sem pestanejar.


 Na fantasia não existe adultério nem o perigo de flagra. Os únicos que não costumam dar ibope são os parceiros habituais da vida real. Esses trazem uma carga de realidade que tornam difícil a fantasia. Mas como nessa área tudo é possível, até isso, às vezes, acontece, em situações idealizadas.


 Bom, o final é sempre meio frustrante. Como uma bolha de sabão que, repentinamente, explode, a fantasia se esvai com o orgasmo. É como na letra da música “Bala com Bala”, de Aldir Blanc, em que a coragem é substituída pelo cansaço. 


 Mas a vida recomeça.

GAROPABA



O ano era 1968; O carro era um JK do mesmo ano. A estrada era a 101, que nos levava a Garopaba, onde, mais uma vez, iríamos acampar na praia. Aproveitávamos o fim de semana de um interminável verão. 


Mas deixa-me falar um pouco daquela praia. Garopaba era um tranquilo vilarejo de pescadores durante o resto do ano. No verão, o local era assaltado por um bando de hippies, vagabundos, viciados e toda uma fauna difícil de descrever aqui. Sobre a vila, naquele período, havia uma permanente nuvem formada pelos milhares de baseados acesos. A pequena praia era invadida por aquela turba. Por incrível que pareça, os invasores mantinham ótima relação com os nativos de Garopaba. Talvez se devesse ao fato de haver uma distância abissal na cultura dos visitantes e dos moradores, que fazia com que ambos respeitassem-se. 


Talvez houvesse uma mútua admiração por essas duas culturas. Talvez fosse a grana que os “turistas” traziam, o que dava um certo dinamismo no comércio daquela gente, muito pobre. Mas voltando à viagem. O carro estava lotado de jovens irresponsáveis (isso é um pleonasmo). Naquela época não havia radar nem consciência de se devia respeitar algum tipo de limite de velocidade. A velocidade máxima do carro era 160 km/h, então era essa velocidade de cruzeiro. 


Na estrada, um tipo com um cabelão crespo e barba idem estava pedindo carona. Imediatamente o carro parou. Como não dar carona a um irmão? Ele estava com aparência de sujo, mas não importava. Nós também não gostávamos de banho. Adentrou, ajeitou-se como pode e, muito solícito, ofereceu a cachaça que trazia. A oferta foi aceita, inclusive pelo motorista, e a garrafa foi sendo esvaziada pelo bico, como chimarrão. A velocidade mantinha-se a mesma: a máxima. Havia chovido, o asfalto ainda estava úmido. 


A viagem transcorria tranqüila até, logo após galgarmos uma lomba, demos com uma barreira da polícia federal, a menos de 200 metros. Minha reação foi automática. Preciso frear e rápido, senão irei atropelar a, barreira inteira. Meti o pé no freio com força. O carro, que, vazio, pesava 1.200 kg, saiu deslizando pelo asfalto molhado, indo de encontro a vários carros que já estavam no acostamento, paralisados pela mesma barreira. 


O choque foi lateral, riscando a lataria de uma meia dúzia de Aero Willis, Simcas, Gordinis e outros. O JK só se imobilizou quando amassou o para-choque traseiro de um Dkw Vemag, que, casualmente, pertencia ao meu irmão, barrado antes. Um policial federal aproximou-se do carro. Eu estava horrorizado. Além da desgraça que havia provocado, havia o bafo da cachaça. Pensei: Estou perdido. Minha vida acabou. 


O policial, talvez tão estupefato com o que tinha acontecido, ao me fazer sair do JK, disse que eu deveria dirigir com mais cuidado, mas não me multou. Mandou acertar o prejuízo com os demais proprietários dos carros danificados. Respirei fundo, peguei o talão de cheque e fui, um por um, me desculpando e perguntando quanto estimava o estrago. 


O talão foi quase inteiro. Ali, também, liquidei com uns dois meses de meu querido salário do Banco do Brasil, local onde eu era tido como um retardado, pelo meu pouco interesse pela carreira bancária.