domingo, 3 de março de 2013






O galã de Cacequi


Nos tempos da minha juventude em Alegrete, a maneira mais fácil de se chegar a Porto Alegre, senão a única, era ir de trem. A famosa VFRGS (Viação Férrea do Rio Grande do Sul ou Vovô FoiRoubar Galinha Sozinho, dos ingênuos trocadilhos da época), estava no auge. Seus trens serviam o estado de maneira intensa, indo e vindo de Porto Alegre a Uruguaiana, passando por Alegrete, entre tantas outras cidades. Era quase uma epopeia ir de Alegrete a Porto Alegre. Tomava-se o trem que vinha de Uruguaiana pela manhã, viajava-se o dia inteiro até Santa Maria, onde era preciso fazer uma baldeação para outro trem. Depois, viajava-se a noite inteira para chegar a Porto Alegre de manhã cedo, no dia seguinte.


Uma das estações onde o trem parava era a de Cacequi, grande entroncamento ferroviário da época.


Era uma estação imensa para os meus olhos interioranos.


Na sua plataforma desfilavam figuras incríveis, apressadas em pegar outros trens.


Na multidão de viajantes apareciam também alguns habitantes da pequena cidade, que iam ver a única atração do local: a chegada de um trem.


Alguns rapazes da cidade vestiam sua melhor roupa para apreciar o grande espetáculo da multidão de viajantes.


Entre eles, podia-se notar sempre um tipo que usava melena bem cuidada, com bastante fixador (Glostora? Gumex?), camisa de mangas compridas, mangas dobradas, levando sempre um rebenque, daqueles revestidos de linhas coloridas, feitos por presidiários. Nós, jovens modernos, que escutávamos Paul Anka e Elvis Presley no Telefone Pedindo Bis da Rádio Bandeirantes de São Paulo, logo o apelidamos de “Galã de Cacequi”. O tipo desfilava olhando para dentro dos vagões estacionados, na esperança de despertar a atenção de alguma moçoila curiosa. Batia o rebenque nas coxas, numa demonstração de que era o senhor do pedaço. Esse tipo fez escola, pois cada vez havia mais galãs.


Que saudade da VFRGS e das horas que passava vagando de vagão em vagão, embalado pelo barulho cadenciado das rodas do trem sobre os trilhos!


Ela fez parte da minha história, da minha caminhada em direção ao mundo.


“Caminho de ferro, mandaram arrancar…”, como diz Milton Nascimento em “Ponta de Areia”.

Erion Renato Pozzobon

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