Ah! Essas esquerdas!
Durante minha juventude, escutava sempre o mesmo mantra: o
capitalismo é um regime agonizante, o mundo encaminha-se para o socialismo, a
história está a nosso favor.
Os teóricos do socialismo argumentavam que o grande mal do
Brasil era a espoliação da sociedade brasileira pelo capitalismo selvagem
internacional, orquestrado pelas multinacionais.
Havia uma tira em quadrinhos mostrando o Zé Brasil, um pobre
brasileiro que durante o seu dia, desde a escovação de dentes matinal até o último
gesto, antes de dormir, utilizava produtos fabricados por multinacionais.
Veio a ditadura militar e as esquerdas foram demonizadas.
Grandes teóricos, como Celso Furtado, Florestan Fernandes e Fernando Henrique
Cardoso sofrem perseguição do governo. A “inteligência” brasileira protestou.
O mundo mudou, os regimes comunistas caíram, ser esquerdista
passou de moda. Agora, podemos olhar aqueles tempos desapaixonadamente.
Os problemas do Brasil foram mesmo causados pelas
multinacionais?
O Zé Brasil, se não escovasse os dentes com escova e pasta
de dentes produzidos por multinacionais, provavelmente não escovaria os dentes,
considerando que o país não possuía indústria nacional. O resultado seria que
os brasileiros, uma população de desdentados, teriam sua situação piorada.
Os militares odiavam qualquer tipo de pensamento independente. Para eles, a
educação e a cultura cheiravam à subversão porque estavam ligados à liberdade
de expressão. Durante o governo militar, Cassandra Rios, uma escritora
pornográfica, foi perseguida pela censura, teve seus livros cassados e morreu esquecida.
Mas ninguém da esquerda a defendeu.
Argumentavam que era má escritora. Mas má escritora não tem direito de
escrever?
Vamos introduzir um exemplo fora de nossas fronteiras. A
Coréia do Sul, há quarenta anos, tinha renda per capita menor do que a do
Brasil. Fez maciços investimentos em educação e a uma geração de iletrados
sucedeu uma geração com formação técnica altamente especializada e outra
geração com ensino superior, mestrado e doutorado. É um dos países onde são registradas
mais patentes no mundo.
A Coréia do Norte fez a experiência comunista que os jovens brasileiros
sonhavam. Deu no que deu, uma tirania que passa de pai para filho, com a
população famélica, vivendo em um grande campo de concentração.
Então o problema não é ideológico, mas sim de educação. Um
povo instruído será vitorioso com qualquer regime. E este é um ponto em que, no
Brasil, esquerdas e regime militar juntaram-se as mãos. Ambos desprezaram a
educação.
Quando as esquerdas tomaram o poder no Brasil, por via do
voto, o operariado foi endeusado, como em um bom e antigo romance comunista.
Mas quem quer ser operário? As condições em uma indústria são difíceis, penosas
e até insalubres. Muito mais fácil é ganhar a vida prestando serviços, uma
atividade mais gratificante, criativa e com tempo de trabalho flexível, do que
sofrer oito horas diárias em uma fábrica. Entretanto, a prestação de serviço é
atividade de país desenvolvido, que exige educação. A da indústria nem tanto.
Por que, então, as lideranças do Brasil, de esquerda e de
direita desprezam a educação?
A resposta está mais recuada no tempo. Desde o tempo do
Brasil colonial, a ignorância do povo foi arma de manobra dos poderosos. O
analfabetismo facilitava a exploração do trabalho urbano, industrial, comercial
e doméstico, enquanto, no campo, permitia aos grandes proprietários de terras
tratarem seus empregados e agregados em regime de semiescravidão.
A situação presente melhorou, e muito, considerando a
terrível situação do Brasil na educação. Mas os esforços no sentido de
erradicar a ignorância são tímidos e desconexos, como se a amarrados, ainda, a
nossas arcaicas tradições.
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