segunda-feira, 10 de setembro de 2012





O fantasma do seu Pacheco

"...e olhando com o rabo do olho para ver se tinha toda a atenção"

  Eu entendo os que curtem o Acampamento Farroupilha de Porto Alegre não pelo lado cívico, digamos assim, mas pelo que ele é por si só. Acho até que o lado farroupilha é o de menos. Falamos da vida campeira, do mate, do assado na trempe, do fogo no galpão, da comida de panela e da canha que corre solta disputando espaço com a charla.   

  Eu entendo e até mais do que isso, gostaria de estar lá. Ou de voltar para os tempos em que seu Pacheco era capataz da Estância do Marco, quando o arroz ainda não dominava os campos. Chaleira chiando, noite caindo, fumaça no galpão, cheiro de pelego e conforto rude, chuva que Deus mandava e seu Pacheco lastimando que seus olhos já não enxergassem mais como antes.
  
  - Já não devulgo mais nada...

  Em épocas anteriores devulgava até demais. Alguns anos antes ele falava no mesmo cenário do açude do mato do fundo, de como dava peixe ali. E botando mais um pau de fogo e olhando com o rabo do olho para ver se tinha toda a atenção, falou com a voz mais solene que tinha.
   
 - Certa vez uns gringos pescaram naquele açude uma traíra que tinha um pivô de ouro...

  Rimos. No ano seguinte o seu Pacheco chegou no parapeito e falou que tinham pescado outra traíra, das grandes. 

   - Pelo que me contaram, era a dentista da outra, a que tinha pivô de ouro.

  Às vezes me dá saudade do seu Pacheco e do seu linguajar, dos seus causos e daquele tempo. Imagino que os fantasmas de Pachecos vagueiem nas noites de chuva entre os piquetes do Acampamento Farroupilha, parando aqui e ali para ouvir a prosa, sentir o cheiro de pelego e da madeira queimando e ouvindo causos sem poder participar, passando pelas frestas e sentando perto do fogo que já não os aquece mais.  


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